McCARTHY (1995), enfatiza que o actual uso do cinto (obi) à volta do "kimono" (karate-gi) tem raízes no fundador do Judo. Jigoro Kano introduz a inovação de distinguir os diferentes níveis de prática através do desenvolvimento do sistema dan/kyu.
O dan ou cinto negro, indicava um nível de prática avançado e os seus possuidores tornam-se conhecidos como yudansha (recipientes de dan); as graduações de kyu representavam os diversos níveis de competência abaixo do dan, sendo conhecidos como mudansha (aqueles que ainda não receberam o dan).
Segundo apurou o autor já citado, depois de estabelecer o kodokan, Sensei Kano distribuía faixas negras aos seus yudansha para serem usadas no dogi (uniforme de prática) estandardizado e, após 1907, a faixa negra é substituída pelo kuro-obi (cinto negro) que se torna o standard até hoje.
TOKITSU (1993) refere-nos que quando Gichin Funakoshi é convidado em 1921 pelo Sensei Kano para fazer uma demonstração de okinawa-karaté-jutsu no kodokan a 17 de Maio, por um lado, confeccionou à mão o seu kimono a partir de um tecido branco de algodão, tendo como modelo um judogi (assim como confeccionou o do seu assistente S. Gima), e, por outro lado, utilizou um cinto negro por indicação do próprio Jigoro Kano (curiosamente não utilizou o de um Judoka - Gima era cinto negro de Judo - mas sim o do seu quimono de cidade).
TOKITSU (1993) salienta ainda que no início, Jigoro Kano só utilizava o sistema de cinco graus de dan e não o sistema de dez como actualmente se usa. Em 1883 Kano com 23 anos atribui o grau de 1º dan pela primeira vez aos seus alunos Tomita e Saigo.
Quanto a Funakoshi, por influência e conselho directo de J. Kano, desenvolve um sistema de graduações equivalente ao Judo e atribui em 1924 os primeiros diplomas de 1º dan a Kasuya e Gima. É a primeira vez que se passam diplomas de graduação em karaté.
Os outros mestres de karaté fazem progressivamente o mesmo. No início, como no caso do Judo, com um sistema de cinco graus, mas posteriormente, esse sistema passará na maioria das escolas para dez graus.
É ainda de referir que para além do sistema dan/kyu, outros títulos foram atribuídos no seio de algumas organizações, de entre as quais se destaca indiscutivelmente a Dai Nippon Butokukai (Associação Japonesa das Grandes Virtudes Marciais). Fundada em 1895, recebe do governo autorização para "investigar, preservar e promover os bugei Japoneses; fazer exibições e torneios; recolher armas, equipamentos e informações históricas sobre as tradições clássicas de combate; e publicar materiais relacionados com as artes marciais" (McCARTHY, 1995, p. 6 - tradução nossa).
Os títulos gerais desenvolvidos no seio da organização foram, do mais alto para o mais baixo: Hanshi, Kyoshi (originalmente conhecido como Tasshi) e, a partir de 1934, foi adicionado o título de Renshi.
O reconhecimento do karatejutsu de Okinawa como uma Arte Marcial Japonesa estava dependente dos critérios de desenvolvimento da modalidade que o Butokukai lançou aos seus mestres:
Desenvolver um uniforme standard;
Adoptar o sistema de graduações dan/kyu de J. Kano;
Estabelecer um sistema de ensino/avaliação;
Mudar o primeiro ideograma e adicionar o sufixo do;
Criar um formato competitivo seguro para testar o espírito dos seus estudantes.
Após o encontro destes critérios de desenvolvimento da modalidade em Dezembro de 1933, abriram-se as portas para o reconhecimento do karatedo como um Budo Japonês moderno e assim, reconhecer os mestres de Karaté como mestres de Budo.
Em 1935, segundo TOKITSU (1993), Chojun Miyagi apresenta-se para fazer exame para um título de Mestre de Budo no Butokukai, sendo a primeira pessoa a apresentar-se em Karaté, disciplina ainda não reconhecida como budo. Obtém o título de kyoshi (segundo nível) o que, para o mesmo autor, é excepcional já que os fundadores das outras três escolas obtêm apenas o título de renshi (terceiro nível) - Hironori Ohtuka (Wado-Ryu) obtém-o em 1938, Kenwa Mabuni (Shito-Ryu) e Gichin Funakoshi (Shotokan) em 1939. Nesta época tais títulos eram indispensáveis para a consolidação do reconhecimento do Karaté como budo.
Por fim, e antes de concluirmos estes considerandos iniciais, gostaríamos de evidenciar que, do ponto de vista mais objectivo, a graduação no Butokukai era, e ainda é, a "avaliação do progresso individual rumo à obtenção da perfeição humana através da prática das tradições de luta. Esta avaliação não é apenas baseada em aspectos físicos, mas procura ter em conta o desenvolvimento dos aspectos físico, moral e espiritual do ser humano: o objectivo de cultivar pelo budo o nosso mundo interior é um esforço para evoluir no mundo exterior" (McCARTHY, 1995, p. 7 - tradução nossa).
Assim, no âmbito da problemática central em análise, poderemos concluir:
O sistema de graduações no Karaté desenvolve-se a partir de modelos comuns aos restantes budo, sendo de destacar a enorme influência de Jigoro Kano (fundador do Judo) no estabelecimento do sistema dan/kyu (inicialmente com cinco níveis de dan, e depois com dez).
O sistema de graduações do Karaté (dan/kyu) nasce com um propósito técnico claro, procurando distinguir os níveis de prática dos praticantes, mas encerra também um propósito político: o reconhecimento público oficial da modalidade.
O sistema de graduações dos mestres de budo (três níveis: hanshi, renshi e kyoshi) emerge como forma de reconhecimento público dos mestres das diversas disciplinas reconhecidas pelo Butokukai e, na época, para os mestres de Karaté, tais títulos eram importantes, colocando-os a par como os mestres de Judo ou Kendo no âmbito de uma organização governamental.
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